Marca de um tempo obscuro, a falta de capacitação do trabalhador brasileiro atinge seu ápice em um momento no qual seria preciso ter o maior número possível de operários bem treinados.
A economia, estagnada pela falta de sólidos projetos governamentais, pela elevadíssima carga tributária, pela falta de investimentos em setores fundamentais para o país e com a taxa de desemprego, acima dos dez por cento, denuncia não haver como acomodar o homem do povo, aquele que busca por cargos de base, no chão de fábrica.
E esses se veem obrigados a empreender na informalidade, em busca de um rendimento mínimo que lhes assegure o ganha pão.
Ao criar micro negócios, o trabalhador informal se descobre diante dos mesmos desafios dos grandes empresários: oferecer produtos ou serviços de qualidade para auferir lucro, de modo a salvaguardar a integridade do ofício. Só o que muda é a escala.
Porém, um fator alarmante tem sido responsável pela derrocada de milhares desses microempreendedores: o analfabetismo funcional.
Por menores e aparentemente mais simples que sejam os desafios de um empreendimento em pequena o micro escala, os conceitos de empreendedorismo continuam os mesmos e dada à realidade a que estão expostos os consumidores, ainda mais complexos de se implantar por aqueles que não leem o mercado com precisão.
Cabe o exemplo do instalador de esquadrias que, contratado por uma grande construtora peca ao vedar as janelas. O cliente comprador do imóvel irá transferir a responsabilidade diretamente para a construtora, que fará a cobrança do resserviço ao executor. Aqui, nesse cenário, esse pequeno empreendedor está coberto pela condução dos profissionais de manutenção e de assistência técnica da contratante, interface que o protege do atrito.
Mas o que acontece quando essa mesma pequena empresa tem contato direto com o consumidor e se obriga a execução dos reparos em prazos curtos, sob pressão e sendo açoitado pela iminente possibilidade de uma denúncia no PROCON? Em mais de 80% dos casos, o caminho adotado pelo mesmo microempresário exporá sua empresa ao risco de uma ação judicial, que muitas vezes irá resultar em indenizações por danos morais e restituições.
Isso ocorre por falta da busca da informação corporativa (não por falta de acesso à leitura específica, uma vez que os dados estão fartamente disponíveis em todas as plataformas). É a falta de capacidade de ler, compreender, fazer um juízo de valores e aplicar ao negócio as técnicas, as soluções e as vacinas que fazem a diferença entre os dois casos em tela e, entre obter sucesso ou amargar o fracasso. No primeiro exemplo, há alguém “lendo” as reações do mercado e conduzindo o fornecedor na direção de prazos corretos, custos racionais, elevação da qualidade de atendimento, no emprego da logística ideal e no aprendizado contínuo para não repetir o erro.
Nas fábricas e empresas de serviços Brasil afora, a incapacidade de compreensão de instruções complexas tem exigido das companhias elevado investimento na reeducação dos funcionários e, muitas vezes, os tem conduzido novamente às salas de aula para reaprender a fixar regras e a firmar a atenção em objetivos claros.
Em nota técnica de 7 de fevereiro de 2022, o Instituto Todos pela Educação, com base na Pnad Contínua, revela que no Brasil, de 2019 a 2021, o número de crianças que não sabem ler (com seis e sete anos) saltou de 1,4 milhão para 2,4 milhões.
O retrocesso em nosso sistema educacional nos faz reféns de inúmeros modos, mas é inquietante deixarmos de preparar futuros trabalhadores para compreenderem o mundo no qual vivem: exigente, veloz e altamente competitivo. Estamos deixando de estruturar nossa sociedade e orientá-la no sentido da produção.
Cai a empregabilidade, despenca a produtividade, cria-se descompasso na capacidade de produção versus necessidades sociais e mergulhamos nosso país - potencialmente o mais forte da América Latina - em um buraco negro socioeconômico, cujas forças de atração engolem a autoestima coletiva.
Sem os resultados da educação teórica perdemos potencial intelectual para educar de forma prática. Estamos deixando de estimular, desde o nascedouro, o surgimento de empresários, de cientistas, de analistas, dos desenvolvedores e inovadores que irão acelerar a mecânica econômica. Mas deixar de formar mão de obra produtiva nos afeta direta e imediatamente onde mais sentimos: na capacidade de materializar projetos.
E não há desenvolvimento sem que as ideias saiam da tela.
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